O presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Marco Maia, disse à imprensa que colocará o relatório do Deputado Aldo Rebelo que propõe mudanças viscerais no Código Florestal Brasileiro em votação na próxima terça-feira, dia 3 de maio. O relator confirma que apresentará o texto final na próxima segunda-feira, dia 2, para que a votação ocorra no máximo até quarta-feira, dia 4. Sem tempo para a sociedade analisar e se manifestar sobre a proposta.
A falta de transparência e o açodamento na votação não são coerentes com a democracia em que vivemos, com a importância e o aprofundamento que o tema merece. Não existe consenso ainda na proposta defendida pelo relator. Por isso, mais uma vez, é necessário que os cidadãos se manifestem sobre o que está sendo feito em seu nome.
O Código Florestal diz respeito a todos nós. É a principal lei que protege nossas florestas e biodiversidade. Já perdemos 93% da Mata Atlântica, mais da metade do Cerrado e da Caatinga e quase 20% da Amazônia. As perdas de florestas são tão assustadoras em todo o mundo que a Organização das Nações Unidas (ONU) definiu 2011 como o Ano Internacional das Florestas. A intenção é fazer uma convocação aos governos, empresários e cidadãos do mundo para a responsabilidade de recuperar as áreas já degradadas e protegermos adequadamente o que ainda nos resta.
Padecemos também de graves problemas de contaminação dos rios e aquíferos por agrotóxicos e adubação excessiva. E para piorar, a maior parte de nossa contribuição para o agravamento da crise climática vem da forma como produzimos carne e grãos, ou seja, de como usamos nossas terras e florestas. Fontes que respondem por quase 70% das emissões de gases de efeito estufa.
Na última década conseguimos importantes conquistas na luta contra o desmatamento. O ritmo de destruição da Amazônia caiu cerca de 70% nos últimos seis anos, evitando que fossem lançadas na atmosfera mais de quatro bilhões de toneladas de CO2. Em decorrência disso, o Brasil pode criar uma Política Nacional de Mudanças Climáticas e assumir compromissos de redução das emissões de gases de efeito estufa. Metas assumidas pelo Brasil na Conferência de Copenhagen pelo próprio Presidente Lula.
Mas esses promissores resultados são apenas o começo de uma mudança gigantesca que precisamos fazer para conseguir desenvolvimento com sustentabilidade. Podemos fazer nossa economia crescer, mas sem destruir nosso meio ambiente. E a maior garantia que a sociedade pode ter de que continuaremos avançando é a existência de uma forte governança ambiental no país, da qual o Código Florestal é o principal esteio. Ele estabelece os limites para o uso do nosso solo, de modo a permitir que todas as atividades econômicas possam acontecer de forma cuidadosa para preservar a qualidade de vida de todos nós e das próximas gerações.
No lugar de discutir a atualização do Código Florestal para diminuir a proteção das florestas e conferir anistias aos que descumpriram a lei, deveríamos debater uma política florestal que melhore a proteção das florestas, que crie políticas de incentivo para promover o desenvolvimento do setor agrícola e florestal e a geração de empregos e melhoria da renda no setor rural numa escala muito maior. E, obviamente, discutir os ajustes necessários e as políticas de apoio para que os produtores possam superar os passivos ambientais e para que nossa agricultura possa ganhar em qualidade.
Somos uma potência ambiental, detemos mais de 20% das espécies vivas conhecidas, 11% da água doce e a maior floresta tropical do mundo, que produz mais de 20 bilhões de toneladas de água por dia, além de uma rica diversidade de biomas. É essa riqueza natural que nos permite ser um dos campeões mundiais de produção agrícola.
Não podemos decidir sobre o futuro de nosso desenvolvimento dessa forma. A dificuldade de se chegar a um consenso entre o governo e o relator do projeto, a falta de transparência e participação social com que ambos estão discutindo demonstram, claramente, a falência desse tipo de negociação. Os cientistas nacionais estão clamando por participação, assim como os agricultores familiares, entidades ambientalistas e profissionais de vários setores.
Todas essas razões me levam a fazer um apelo à Presidente Dilma Rousseff e aos deputados pelo adiamento, por alguns meses, da votação anunciada para a semana que vem. Para tanto, poderíamos adiar o prazo de averbação da reserva legal previsto para 11 de junho, de forma que tenhamos um ambiente menos açodado para o diálogo.
Marina Silva, 53, ex-senadora do Acre pelo PV, foi candidata do partido à Presidência da República em 2010 e ministra do Meio Ambiente do governo Lula (2003-2008)
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